Saúde

Endometriose e Fisioterapia: sabia que a dor é o 5.º sinal vital?

É necessário eliminar estas ideias pré-concebidas da nossa cabeça e do nosso léxico porque, efetivamente, ter dor durante a menstruação não é normal.

A endometriose é uma patologia que afeta um grande número de mulheres em idade fértil e a dor – dor incapacitante – é a característica maior desta patologia que está fortemente associada ao ciclo menstrual, essencialmente à Menstruação. Os dias de sangramento são dias duros pois a dor cresce e, muitas vezes, impõe-se, a necessidade de recorrer a fármacos e/ou alterar a rotina daqueles dias por forma a aliviá-la.


De um modo breve e simples, esta é uma patologia do tipo infiltrativa em que o endométrio, que é a camada interna do útero que descama e dá origem ao sangue menstrual que vemos, não sai (na totalidade) e forma uma espécie de coágulos de sangue dentro do útero. Regra geral, estes coágulos ultrapassam a barreira do útero e podem mesmo afetar outros órgãos, como é o caso dos ovários, da bexiga, do intestino e, em casos mais graves, órgãos abdominais. Curiosamente, já ouvi relatos da presença de placas de endometriose no diafragma torácico.


Há uma expressão do senso comum que fomos habituadas a ouvir desde cedo: “deve estar com o período” ou “tens de aguentar, ter dor quando tens o período é normal”. Pois isto é algo que precisamos de desmitificar: é necessário eliminar estas ideias pré-concebidas da nossa cabeça e do nosso léxico porque, efetivamente, ter dor não é normal. Nunca. E o período não tem (não deve ter) uma carga ou conotação negativa. Ao invés: menstruar é um sinal de saúde. O ciclo menstrual diz-nos o quão saudáveis somos e estamos. E, portanto, sentir dor incapacitante é um alarme que nos deve fazer questionar e procurar respostas para resolver esta queixa: “tenho dor porquê?”, “o que se passa com o meu útero?”, “o que se passa com o meu corpo?”, “a que profissionais devo recorrer?”.


A dor é o 5.º sinal vital: assim defende a Direção Geral da Saúde, e, portanto, merece toda a atenção do mundo. Por favor, não continuemos a desvalorizá-la. Habitualmente, em casos de dor menstrual, a solução mais rápida passa por tomar uma “pílula milagrosa”. Não obstante, aquilo que acontece ao nosso ciclo menstrual quando estamos em contraceção hormonal, é que este fica suprimido, latente, inativo. Ou seja, em bom rigor, não menstruamos. A menstruação resulta de um ciclo onde há ovulação, logo, se não ovulamos – porque é esse o objetivo dos métodos contracetivos – não menstruamos. O sangue que vemos todos os meses, quando estamos em contraceção hormonal, chama-se hemorragia de privação, privação hormonal. Por isso vemos os últimos comprimidos do blister da pílula com uma cor diferente – são água e açúcar – e não hormonas como os restantes. Assim se explica o efeito da pílula para baixar a dor menstrual. Se não menstruamos, não temos dor menstrual, certo? Na verdade, a pílula camufla esta patologia. Atenção: existem exceções em que a pílula pode ser clinicamente muito bem-vinda, mas esta não é a regra.


Se tem dor menstrual – o nome científico é dismenorreia – conte com o seu médico ginecologista para despistar possíveis causas e saiba que, por norma, o seu estilo de vida, ou seja, aquilo que come, o nível de hidratação, os níveis de açúcar no sangue, os seus níveis de stress/cortisol, a quantidade e a qualidade do seu sono, a prática de exercício físico bem como a forma como encara a tua vida, pode necessitar de ajustes.


Além disso, a endometriose embora esteja muito associada ao útero e ao aparelho reprodutor feminino, é uma patologia sistémica, isto é, importa estudar e potenciar ao máximo todo o sistema metabólico, microbioma intestinal, sistema imunitário, quantidade de minerais e vitaminas que o nosso corpo dispõe para o seu funcionamento para assim conseguimos dar conta da componente bioquímica envolvida.


Todavia, não podemos deixar de lado outra componente: a biomecânica ou a componente física, propriamente dita, que muitas vezes influencia os quadros de dor, seja em pacientes que passaram pela cirurgia ou não. As aderências, a atividade muscular, a rigidez de alguns ligamentos dentro das pélvis, a posição do útero, a microcirculação dos tecidos endopélvicos, contribuem para a dor menstrual, para a dor pélvica, para a dor profunda durante as relações sexuais, alimentando este ciclo vicioso de dor-tensão-medo-dor.


Através da Fisioterapia Uroginecológica conseguimos colocar em prática várias técnicas para libertar aderências, para ganhar mobilidade visceral sobretudo do útero e colo do útero (permitir que o sangue saia, por exemplo, sem dor), melhorar o trofismo celular, melhorar a dinâmica intestinal e vesical, normalizar a atividade muscular e permitir que as pacientes vivam o mais equilibradas possível com o seu corpo e com o seu ciclo menstrual, porque se conseguimos quebrar o ciclo de dor, conseguimos quebrar muito mais do que isso!


Maria João Caçador

Licenciada em Fisioterapia; Pós-graduada em Fisioterapia na Saúde da Mulher; Exerce prática clínica na FISIOGlobal, área da Reabilitação Uroginecológica.

Ver Mais

Fonte:

Current and emerging treatment options for endometriosis.

Endometriosis and physical exercises: a systematic review

Endometriosis: Epidemiology, Diagnosis and Clinical Management

he Clinical Anatomy of Endometriosis: A Review

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