Exercício

Processo prático de aprendizagem do movimento, por David Mascena

Design de um programa de aprendizagem motora: fase cognitiva, associativa e autónoma

Ponto 1: classificação do aluno segundo a pirâmide de performance


A pirâmide de performance é um modelo teórico desenvolvido pelo Gray Cook a partir do qual procura mostrar a sequência hierárquica desde uma habilidade básica até a um movimento especializado.




Neste modelo está contido um forte conceito neurofisiológico. Se há um déficit nas habilidades básicas de movimento (compromissos entre estabilidade e mobilidade) há um déficit perceptivo e, consequentemente, um déficit motor que se repercute tanto na habilidade básica como na específica.


Então, no primeiro momento, iremos classificar o nosso aluno dentro desta pirâmide, classificando o seu déficit como de primeiro nível (competência de movimento), segundo nível (capacidade de movimento) e terceiro nível (especialização de movimento).


Um aluno com déficit em competência é um aluno que precisa de restaurar as suas habilidades motoras. Para fazermos esta identificação usamos testes de movimento, como por exemplo o FMS (functional movement screen) e, a partir destes resultados, traçamos uma estratégia, visando restaurar habilidades básicas de movimento, pois sem elas não iremos oferecer uma percepção plena de movimento ao sistema nervoso e, sendo assim, a especialização de movimento torna-se deficitária.


Alunos com déficit em capacidade de movimento são alunos que precisam de fortalecer o padrão de movimento. A realização de movimentos desportivos (gestos técnicos) para serem plenos necessitam que haja a capacidade de realizá-los com força, velocidade e vigor porque isso também interfere directamente na percepção do sistema nervoso.


Como aprender um arremesso no basquetebol se não temos força para que a bola chegue ao cesto? Como aprender um bom jab sem força e velocidade na rotação da coxo-femoral?


Sendo assim, indivíduos identificados através dos testes com deficit, estando competentes em movimento (primeiro nível), devem ser submetidos a programas específicos para o desenvolvimento destas capacidades.


Finalmente, alunos com competência de movimento (mobilidade e estabilidade aceitáveis) e com boa capacidade de movimento (fortes e velozes) estão aptos a entrarem num programa específico de habilidades motoras especializadas.


Os deficits de terceiro nível são encontrados quando indivíduos competentes e capazes (primeiro e segundos níveis) apresentam pouca eficácia em testes específicos de acurácia, precisão, agilidade, etc., neste caso, iniciamos um processo de aprendizagem motora específica e desenvolvimento de programação motora especializada. Esta fase inclui drills para habilidades específicas onde serão usadas programações pedagógicas, de acordo com o nível do aluno e somente após a plena aprendizagem desta habilidade será possível aplica-la em situação real (e.g.: jogo, luta).


Ponto 2: design do programa de aprendizagem motora


Independente do programa ser para habilidades básicas ou específicas a sequência para esta aprendizagem inclui as mesmas fases:


Fase 1 - Cognitiva: nesta fase o aluno será informado sobre o que será necessário para executar a tarefa. Neste momento o aluno ainda não se preocupa com o resultado ou com as falhas na realização da tarefa, tendo apenas como preocupação formar uma ideia teórica da tarefa a ser executada. É interessante que nesta fase o professor forneça o máximo de informações possíveis ao aluno, pois a partir da ideia que formamos da habilidade, criamos um primeiro planeamento de execução.


Fase 2 - Associativa: esta fase é associada ao aumento da consistência de desempenho na tarefa, isto é, o refinamento do movimento. Envolve a capacidade de detectar e corrigir erros, por isso, ao final de cada tentativa devemos perguntar-nos: o objectivo do movimento foi alcançado? O movimento foi executado conforme o planeado? Respondendo a estas duas perguntas conseguimos identificar e traçar estratégias para a correcção de erros.


Sabendo detectar e corrigir erros conseguimos um maior refinamento do movimento, porém nesta fase há uma enorme dependência entre a aprendizagem e o nível de atenção que é dado à execução. Aqui não podemos apenas executar o movimento por executar, mas temos que a cada tentativa traçar todo um raciocínio sobre o movimento.


Primeiro pensamos no objectivo do movimento, depois traçamos um plano de acção para chegarmos a esse objectivo (observe até aqui a importância da fase cognitiva), posteriormente executamos o movimento, avaliamos o resultado deste movimento e, finalmente, podemos modificar esse movimento numa próxima tentativa (caso seja necessário, obviamente). Com esta sequência temos como avaliar e identificar erros na execução dos nossos movimentos.


Esta fase pode durar de horas até anos, dependendo da complexidade da tarefa a ser aprendida e pode ser um ponto crítico deste processo.


Fase 3 - Autónoma: nesta fase o movimento torna-se independente da necessidade de atenção, aqui o indivíduo consegue realizar a tarefa sem precisar pensar nele e poderá inclusive executar mais de uma tarefa ao mesmo tempo. Este é o objectivo que se foca na excelência dos gestos técnicos desportivos, que o atleta consiga realizar o movimento com plena autonomia sempre que o mesmo se fizer necessário.


Ponto 3: aplicação da habilidade


O último ponto do processo consiste na aplicação da habilidade aprendida na situação real, que no caso do desporto consiste no jogo, luta, apresentação e etc. Neste ponto, avaliamos o efeito da aprendizagem técnica das habilidades na prática desportiva. Esta fase serve como um feedback deste processo de aprendizagem, pois algumas vezes há uma certa distância entre aprender a habilidade e aplicá-la. Em consequência, novos objectivos a respeito da tarefa deverão ser traçados. 


Sempre que pensarmos numa aprendizagem motora devemos lembrar-nos que este processo é constante e permanente, mas também é descontínuo (factores como lesões e inactividade física fazem-nos regredir neste processo motor), auto-organizado e regido por três factores de restrição:

- o indivíduo (consiste na maturação biológica do sistema nervoso)

- o ambiente (oportunidade de demanda para o movimento)

- e a tarefa em si (cada tarefa a ser aprendida necessita do seu tempo, qualquer nova tarefa necessita de um processo de aprendizagem)

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