Exercício

Relação entre força e comprimento muscular, por Tiago Rocha

Entendimento dos mecanismos neurofisiológicos de grande importância na correcta prescrição do treino

O gráfico que apresentamos no fim deste artigo, foi retirado do livro "Fisiologia do Esporte e do Exercício", dos autores W. Larry Kenney, Jack H. Wilmore e David L. Costill, e na imagem está representada a variação na força ou tensão produzida por um músculo, relativamente a mudanças no comprimento do Sarcómero, durante uma contração concêntrica.


Este gráfico, ajuda a explicar o conceito de comprimento ideal para produção de força.


Segundo este conceito, o comprimento ideal do Sarcómero é aquele onde ocorre a superposição ideal dos filamentos grossos de Miosina e os finos de Actina, o que permite uma maximização da interação das pontes cruzadas.


Simplificando este conceito, percebemos que quando um Sarcómero está completamente alongado ou encurtado (contraído) a produção de força/tensão será menor, na medida em que há poucas interações entre as pontes cruzadas.


Até aqui nada de novo. O problema começa quando em alguns cursos “ensinam” que quando o Sarcómero está perto do seu encurtamento máximo (entre os pontos 4 e 5) existe uma inibição da leitura dos fusos neuromusculares (FNM). Ora este é um erro significativo!


Para quem não sabe, os FNM são recetores de estiramento das fibras musculares, não só à quantidade deste estiramento, mas também à velocidade que o mesmo ocorre. Assim, quando um músculo ou fibra muscular é estirado(a), os FNM também se alongam e enviam sinais aferentes, a partir das suas fibras Ia e II que tem origem nos recetores sensoriais que existem no centro dos FNM.


E o que acontece quando o músculo contrai/encurta?


É compreensível que se pense que quando o músculo contrai/encurta esta informação aferente diminui, no entanto isso não acontece.


A contração de um músculo/fibra muscular acontece devido a um impulso eferente que provém dos Motoneurónios Alfa, que inervam as fibras extrafusais dos músculos, produzindo a contração muscular. No entanto, enquanto este impulso viaja pelas fibras Alfa, existe simultaneamente um impulso que viaja pelas fibras Gama, e que vai inervar as fibras intrafusais que estão dentro dos FNM, nas suas extremidades.


A contração destas fibras intrafusais vai permitir estirar a zona central dos FNM, fazendo com que a informação aferente continue a ser transmitida para Medula e para os centros hierarquicamente superiores. Esta inervação eferente simultânea é chamada de coativação Alfa-Gama, e permite que durante uma contração, e mesmo quando estamos no máximo encurtamento muscular, a informação aferente que é importante, por exemplo para uma correta propriocepção, continue a ser enviada.


Se pensarmos que a informação proveniente dos FNM chega ao Cerebelo, através do tracto espinocerebelar, e que este participa ativamente no controle “online” do movimento que está a ser realizado, rapidamente percebemos que se a informação aferente proveniente dos FNM fosse inibida durante o encurtamento quase máximo de um músculo, iríamos ter um défice proprioceptivo enorme, que nos deixaria mais propensos a lesões.


Para além disso, estudos evidenciam que os FNM auxiliam na contração normal, promovendo um aumento da força muscular.


O correcto entendimento destes mecanismos (neuro)fisiológicos é de grande importância para a correta prescrição de um treino, e uma vez que um mecanismo “básico” e primário não foi bem entendido, a integração deste com outros mecanismos e conceitos mais complexos e amplos fica, desde logo, comprometida.


PS1: A diminuição da taxa de descarga de fundo dos FNM é possível através da introdução de “frouxidão” muscular – quando utilizamos este termo referimo-nos ao facto de um músculo ser efectivamente mais longo/comprido do que a distância entre os seus pontos de inserção – e quando a mesma é introduzida num membro passivo.



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Fonte:

Wilmore, J. et al (2001). Fisiologia do Esporte e do Exercício. Editora Manole. 2.ª edição.

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